Histórias, La Fontaine

A gata metamorfoseada em mulher

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Uma gata mimosa, bela e delicada, era, para seu dono, a coisa mais amada que havia neste mundo.

E o homem, desvairado e inconseqüente, amava perdidamente essa gata além dos limites do que é normal. Um dia ergueu os braços ao céu e, em prece, implorando aos deuses auxílio, fez promessas, orações e magias. Tanto fez até que conseguiu dos deuses que aquele felino se transformasse em mulher: uma dama lindíssima, uma bela mulher, como convinha a todo homem.

Cego de amor casou-se com ela. Homem apaixonado, marido carinhoso, ele a adulava, embevecido pela beleza daquela, cuja origem felina ele havia esquecido completamente. Para o homem, ela era uma mulher igual a todas as outras.

Numa noite, porém, alguns camundongos entraram no quarto conjugal. A mulher sentiu a presença deles e, seguindo seus instintos de gata, começou a caçá-los. Arqueada e ofegante, ela se atirou sobre os ratos, que escapam por um triz.

Ela não conseguiu da primeira vez, mas, na noite seguinte, com os sentidos mais aguçados pela experiência da véspera, assim que os camundongos apareceram, saltou do leito e, em posição felina, arremessou-se sobre eles e os apanhou.

Depois de conservar por muito tempo um licor, o vaso continua a guardar seu odor. Não perde o pano a antiga dobra, por mais que se tente esticá-lo: passado um tempo, ele recobra.

O natural não sofre abalo quando escondido. Só descansa. Subitamente, entra na dança, e não há como refreá-lo, nem a bastão, espada ou lança. Fecha-se a porta com tramela, e ei-lo que sai pela janela.

Fonte: extraído do livro “La Fontaine e o comportamento humano”, de Francisco do Espírito Santo Neto, ditado por Hammed – Editora Boa Nova.

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