Nota do autor:
As igrejas amornecidas da atualidade e os falsos desejos dos crentes, nos diversos setores do Cristianismo, justificam as nossas intenções. Em toda parte há tendências à ociosidade do espírito e manifestações de menor esforço. Muitos discípulos disputam as prerrogativas de Estado, enquanto outros, distanciados voluntariamente do trabalho justo, suplicam a proteção sobrenatural do Céu.
Templos e devotos entregam-se, gostosamente, às situações acomodatícias, preferindo as dominações e regalos de ordem material.
Observando esse panorama sentimental é útil recordarmos a figura inesquecível do Apóstolo generoso. Muitos comentaram a vida de Paulo; mas, quando não lhe atribuíram certos títulos de favor, gratuitos do Céu, apresentaram-no como um fanático de coração ressequido. Para uns, ele foi um santo por predestinação, a quem Jesus apareceu, numa operação mecânica da graça; para outros, foi um espírito arbitrário, absorvente e ríspido, inclinado a combater os companheiros, com vaidade quase cruel. Não nos deteremos nessa posição extremista. Queremos recordar que Paulo recebeu a dádiva santa da visão gloriosa do Mestre, às portas de Damasco, mas não podemos esquecer a declaração de Jesus relativa ao sofrimento que o aguardava, por amor ao seu nome.
Certo é que o inolvidável tecelão trazia o seu ministério divino; mas, quem estará no mundo sem um ministério de Deus? Muita gente dirá que desconhece a própria tarefa, que é insciente a tal respeito, mas nós poderemos responder que, além da ignorância, há desatenção e muito capricho pernicioso. Os mais exigentes advertirão que Paulo recebeu um apelo direto; mas, na verdade, todos os homens menos rudes têm a sua convocação pessoal ao serviço do Cristo. As formas podem variar, mas a essência ao apelo é sempre a mesma. O convite ao ministério chega, às vezes, de maneira sutil, inesperadamente; a maioria, porém, resiste ao chamado generoso do Senhor. Ora, Jesus não é um mestre de violências e se a figura de Paulo avulta muito mais aos nossos olhos, é que ele ouviu, negou-se a si mesmo, arrependeu-se, tomou a cruz e seguiu o Cristo até ao fim de suas tarefas materiais. Entre perseguições, enfermidades, apodos, zombarias, desilusões, deserções, pedradas, açoites e encarceramentos, Paulo de Tarso foi um homem intrépido e sincero, caminhando entre as sombras do mundo, ao encontro do Mestre que se fizera ouvir nas encruzilhadas da sua vida. Foi muito mais que um predestinado, foi um realizador que trabalhou diariamente para a luz. O Mestre chama-o, da sua esfera de claridades imortais. Paulo tateia na treva das experiências humanas e responde: — Senhor, que queres que eu faça? Entre ele e Jesus havia um abismo, que o Apóstolo soube transpor em decênios de luta redentora e constante. Demonstrá-lo, para o exame do quanto nos compete em trabalho próprio, a fim de ir ao encontro de Jesus, é o nosso objetivo. Outra finalidade deste esforço humilde é reconhecer que o Apóstolo não poderia chegar a essa possibilidade, em ação isolada no mundo. Sem Estevão, não teríamos Paulo de Tarso.
O grande mártir do Cristianismo nascente alcançou influência muito mais vasta na experiência paulina, do que poderíamos imaginar tão-só pelos textos conhecidos nos estudos terrestres. A vida de ambos está entrelaçada com misteriosa beleza. A contribuição de Estevão e de outras personagens desta história real vem confirmar a necessidade e a universalidade da lei de cooperação. E, para verificar a amplitude desse conceito, recordemos que Jesus, cuja misericórdia e poder abrangiam tudo, procurou a companhia de doze auxiliares, a fins de empreender a renovação do mundo. Aliás, sem cooperação, não poderia existir amor; e o amor é a força de Deus, que equilibra o Universo.
Desde já, vejo os críticos consultando textos e combinando versículos para trazerem à tona os erros do nosso tentame singelo. Aos bem-intencionados agradecemos sinceramente, por conhecer a nossa expressão de criatura falível, declarando que este livro modesto foi grafado por um Espírito para os que vivam em espírito; e ao pedantismo dogmático, ou literário, de todos os tempos, recorremos ao próprio Evangelho para repetir que, se a letra mata, o espírito vivifica. Oferecendo, pois, este humilde trabalho aos nossos irmãos da Terra, formulamos votos para que o exemplo do Grande Convertido se faça mais claro em nossos corações, a fim de que cada discípulo possa entender quanto lhe compete trabalhar e sofrer, por amor a Jesus-Cristo.
Chico Xavier, ditado pelo espírito Emmanuel
Pedro Leopoldo, 8 de julho de 1941.
A seguir, a íntegra do livro.
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